PGFN e Procuradorias dos Estados planejam cobrança de dívidas pós-reforma tributária
Diante dos debates no Congresso sobre a reforma tributária, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), e as procuradorias dos estados e dos municípios planejam como funcionará a cobrança das dívidas fiscais caso o sistema tributário brasileiro seja alterado. Porém, desde já, as procuradorias veem dificuldades de chegar a um consenso sobre como defenderão os novos tributos no Judiciário, tanto em relação a um tributo único nacional quanto ao modelo de IVA dual.
No início de setembro um grupo de trabalho da PGFN começou a realizar uma série de reuniões com membros do Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito Federal (Conpeg) e das procuradorias municipais para tentar coordenar a divisão de tarefas em um cenário pós-reforma tributária.
Preocupações comuns até o momento são se o contribuinte saberá contra qual ente propor ações judiciais e se os novos tributos serão discutidos na Justiça Estadual ou na Federal.
A PEC 45/2019, idealizada pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), cria um tributo único e nacional sobre consumo, que resulta da junção de IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS. A PEC 110/2019 inclui na unificação IOF, CSLL, Cide Combustíveis e Salário Educação. Já o Ministério da Economia defende um modelo de IVA dual, composto pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS) em nível federal e por um IVA resultante da união de ICMS e ISS, que seria dividido entre estados e municípios.
CBS e poder de barganha dos estados
Entre os estados, a resistência principal à CBS se refere à base de cálculo. Por incidir sobre a receita bruta em operações com bens e serviços, procuradores estaduais temem que o IVA federal invada a base tributável do ICMS e do ISS – respectivamente, a venda de mercadorias e de serviços. Por se tratar de uma contribuição, a arrecadação da CBS não será dividida com estados e municípios.
“Nossa preocupação é de perder poder de barganha. A arrecadação que seria do ICMS vai acabar entrando para a União via CBS. Em eventual disputa envolvendo a titularidade do tributo, se for para a Justiça Federal ficaremos em posição de desvantagem”, disse o procurador-geral de um estado.
Uma proposta debatida entre a PGFN e o Conpeg é que as procuradorias estaduais defendam cobranças feitas pelas secretarias de Fazenda ainda que os Tribunais Regionais Federais (TRFs) sejam escolhidos como a seara para debates sobre o IVA dual na segunda instância. Hoje, apenas a PGFN atua nos TRFs, cujo contencioso envolve tributos federais.
“O que for derivado de ICMS e ISS queremos que continue na Justiça Estadual, que é muito mais célere e tem mais capilaridade. São fatores importantes para dar efetividade à recuperação de dívidas fiscais”, acrescentou.
Nem federal, nem estadual, nem municipal
Um tributo único nacional – proposto tanto na PEC 45/2019 quanto na PEC 110/2019 – não seria nem da União, nem dos governos estaduais e nem das prefeituras. As procuradorias dos três entes concordam que coordenar a cobrança de dívidas fiscais será um problema.
As advocacias públicas de estados e municípios temem que o IBS se transforme em uma versão maior do Simples Nacional – cuja arrecadação é compartilhada, mas as decisões do comitê gestor são fortemente influenciadas pela União. Se os processos judiciais relativos aos novos tributos tramitarem na Justiça Federal, os representantes das Fazendas estaduais e municipais avaliam que, em eventual conflito entre os entes federativos, a Justiça Federal tenderia a priorizar os interesses da União.
Porém, como a maior parte do Judiciário digitalizou os processos de maneira a permitir uma atuação remota, um interlocutor da Fazenda Nacional argumenta que apenas a União tem condições de fazer frente ao contencioso do IBS de maneira uniforme no Brasil todo.
“Se tramitar tanto na Justiça Estadual quanto na Federal, teremos 32 tribunais diferentes estabelecendo precedentes em segunda instância. E se separar demais e o modelo não respeitar a autonomia federativa, não fica em pé. No outro dia cai no Supremo Tribunal Federal (STF)”, ponderou um interlocutor da PGFN reservadamente.
Outro problema seria como o contribuinte vai saber onde ajuizar demandas ou contra qual ente litigar. “E se o TRF1 decidir diferente dos TJs da mesma região? Um precedente do Tribunal de Justiça do Estado do Acre (TJAC) sobre o IBS terá a força persuasiva de orientação de comportamento que o CPC queria?”, concluiu.
Com base no exemplo do Simples, o procurador do município do Rio de Janeiro Ricardo Almeida avalia que um tributo que pertence aos três entes não tem dono, o que prejudicará a cobrança e a fiscalização.
“Não tem fiscalização do Simples. E pior que isso é a não cobrança. Quem cobra a dívida ativa do Simples? Não funciona. A União não ajuíza execução fiscal para dívidas abaixo de R$ 1 milhão. São 14 anos desde a criação do Simples e isso ainda não se operacionalizou”, criticou.
Fonte: https://www.jota.info/ Autor: JAMILE RACANICCI